Elizabeti Felix

Quarto ciclo econômico - aço


Publicado em 17/10/2022, por Elizabeti Felix.

O minério de ferro é abundante no mundo, contudo as jazidas se concentram em poucos países. O Brasil possui 8,3% das reservas totais - a quinta maior do mundo. A produção de minério de ferro acontece principalmente em Minas Gerais, Pará e Mato Grosso do Sul, sendo nossa região privilegiada nesse aspecto. Na segunda metade do século XX, começaram a surgir os distritos industriais para a exploração do aço e em Ouro Branco, especificamente, na década de 70, com a implantação do Complexo Siderúrgico da Açominas.

O impacto da implantação da usina formatou novas relações espaciais, sociais, econômicas, etc., trazendo um novo ciclo de riqueza para o município e um novo nível de abordagem para a questão urbana, modificando radicalmente a vida e a estrutura social. Foi imprescindível adequar a cidade para atender aos interesses da empresa. 

A desapropriação foi maciça e compulsória das diversas áreas do entorno da planta da cidade velha para a criação de uma nova estrutura urbana. Ao redor do núcleo de ocupação inicial surgiram novas moradias, ruas, escolas e um hospital, enfim novos bairros. A cidade planejada deveria atender num curto espaço de tempo uma população com cerca de 60.000 habitantes, considerando que durante o período de 20 a 30 anos, sua população deveria estar em torno de mais de 160.000/180.000 habitantes

Essa transformação aliada à questão política trouxe desilusão ao povo nativo, que sonhava com mudanças econômicas e oportunidades. Com tradição agrícola e sem conhecimento técnico, automaticamente as portas se fecharam para os nativos e aos poucos uma nova população configurou o local. Sentindo-se discriminada, a população nativa sentiu-se acuada e ao longo dos anos, resquícios dessa vivência permaneceram nos corações dos moradores mais velhos, que tiveram que sair de suas terras para dar lugar ao crescimento urbano. Mesmo não tendo correspondido às expectativas dos nativos, houve certa preocupação com o novo e o velho na questão da habitação e expansão. Foi elaborado o Plano de Desenvolvimento Urbano (PDU) em 1978, proposto pela Empresa, com a colaboração da Fundação João Pinheiro. O PDU teve o mérito de definir as áreas de proteção histórica e ambiental relevantes para o município. Foi proposta a conservação e a recuperação de bens importantes, como: Sítio da Varginha (Conselheiro Lafaiete), Fazenda Pé do Morro, Carreiras, Cadete e Fazendinha 1º de Maio, no meio ambiente a área de preservação ambiental destinada a Serra do Ouro Branco. Mas não houve um estudo para a preservação do centro histórico. 

Com a chegada de uma nova população para morar no espaço determinado pela empresa, diferenciado por camadas de ocupação: de um lado o traçado antigo e do outro o novo, e, ainda, bairros criados de acordo com a condição econômica dos empregados. O primeiro núcleo habitacional denominado Siderurgia para a população de renda média, bairro Pioneiros para a população de renda média e alta, Bairro dos Inconfidentes para população de renda alta e bairro Primeiro de Maio e Metalúrgico para a população de renda baixa. Essa prática segregou a população por categoria funcional. A formatação do espaço urbano agravou ainda mais a associação entre as partes, deixando a disjunção entre as camadas de ocupação evidenciada. Infelizmente, não houve um real interesse em assegurar a integração, pois o traçado urbano evidenciou este fato. 

Toda essa mudança acelerou o processo de degradação no núcleo histórico, que não era assegurado através de uma legislação específica. Assim, durante a década de oitenta, Ouro Branco dos “ciclos” viu crescer um novo núcleo urbano (empresa e funcionários), tendo por outro lado seu núcleo histórico alterado em nome do progresso, perdendo parcialmente seu passado e sua história.

A área denominada “lago Soledade” (lago artificial para sobrevivência da empresa) foi responsável pela submersão de capela e sobrados, patrimônio histórico que nem chegaram a ser registrados para posteriores gerações. As mudanças repentinas transformaram os nativos em estranhos, em sua própria terra, pois tiveram que sair de suas casas para dar lugar ao alargamento de ruas, principalmente a “Rua da Cruz”, que desapareceu para dar continuidade a Rua Santo Antônio. Muitos de seus moradores foram desapropriados. Traumatizados por se sentirem excluídos do novo, a identidade cultural praticamente desapareceu, fazendo-os infelizes do seu passado e consternados com o futuro. 

Muitas pessoas que chegavam sentiam na pele esse distanciamento, mas ao invés de tentar uma aproximação, as lacunas tornavam-se maiores. Na década de oitenta, existia muita rixa entre os jovens que se dividiam entre os moradores do centro e dos bairros (núcleo). Essa situação ficou muito evidente e foi se arrastando ao longo dos anos que, no mandato 1993/1996, o prefeito da época, Fernando de Oliveira Silva, preocupado com a situação e querendo suprir o espaço vago entre o centro e os bairros, onde se denominava “Estiva”, construiu a “Praça de Eventos”. O propósito principal era de estender e criar nesse espaço um elo entre o velho e o novo.

Fatos passados. É hora de recuperar e consolidar a memória urbana e rural do município, não deixando desaparecer os fios narrativos que conduzem ao passado, tornando-os fortes, completos e verdadeiros para o novo. Nossa geração cresceu, não fazemos parte de forasteiros ou nativos, mas de cidadãos que possuem raízes grossas e vigorosas, pois os filhos dos que chegaram, nasceram ourobranquenses e os que permaneceram, tornaram-se nativos. Hoje seus moradores têm orgulho e consciência de serem ourobranquenses, valorizam sua cidade e desejam seu crescimento sem destruir sua história.

Que venha o quinto ciclo!