Elizabeti Felix

Ouro Branco 300 anos?


Publicado em 11/12/2023, por Elizabeti Felix.

A grande parte das cidades mineiras não possuem registros oficiais de fundação, pois numa época remota, onde apenas eclesiásticos e nobres possuíam alfabetização, muito da nossa história se perdeu. Considerando que Ouro Branco tem duas datas registradas em documentação antiga, a primeira é a data onde a Matriz de Santo Antônio torna-se colativa através do alvará de 16 de fevereiro de 1724, durante o governo de Lourenço de Almeida. Que está diretamente ligada ao reconhecimento conferido de benefício eclesiástico, não podemos considerar essa data como referência de fundação, visto que há muitos registros com informações anteriores de existência. A segunda data foi de emancipação administrativa, econômica e politica em 12 de dezembro de 1953.
Segundo minhas pesquisas inseridas no livro Ouro Branco dos Ciclos, Ouro Branco teve sua origem no fim do século XVII, provavelmente no ano de 1694, com o processo de ocupação iniciado com as primeiras bandeiras e surgiu tendo sua primeira denominação em 1699 por Miguel Garcia.
O local, a princípio, recebeu o nome de seu descobridor como “Ribeiro Miguel Garcia”, tendo, portanto, a primeira denominação em 1699. Logo após os registros indicaram que o local teve sua denominação como “Arraial Miguel Garcia”. Após anos de estabelecimento o arraial adquiriu consistência e teve sua designação alterada para “Santo Antônio do Ouro Branco”, no século XVII, a localidade estava diretamente relacionada à exploração mineral em Vila Rica e região.
Durante a exploração do ouro, vários historiadores, entre eles Carlos Góis relata que muitas pessoas morreram de inanição, porque todos queriam explorar o ouro e ninguém queria plantar, assim o município que não teve a valorização do seu ouro, descobriu uma nova forma de sobrevivência: a agricultura.

“ Com as colheitas de 98, que foram as primeiras obtidas na zona do ouro, tinha-se promovido a abundância, e os arraias de Miguel Garcia e do Carmo repovoaram-se.”
Uma observação quanto a citação acima referente ao ano de 1698, onde já se destacava o arraial pela contribuição de alimentos e voltou adquirir uma condição melhor que atraiu mais moradores.
“Ouro Branco foi uma das mais antigas freguesias de Minas, tornada colativa pelo alvará de 16 de fevereiro de 1724, durante o governo de Lourenço de Almeida. Nesse período Ouro Branco já possuía considerável importância econômica pela prosperidade de sua população”
Essa menção como já relatei refere-se à nomeação como poder eclesiástico, onde foi oficialmente nomeado um padre para a paróquia e realmente demonstra que o povoado já existia há algum tempo.
Antes disso, já havia um padre no povoado, Padre Carvalho viveu no pequeno Arraial de Santo Antônio, onde ocupou o cargo de primeiro vigário, residente entre os anos de 1717 a 1719. Ele realizou o primeiro batizado registrado na freguesia de Ouro Branco e muitas cerimônias de sepultamentos. A razão que trouxe Padre Carvalho a nossa região e a freguesia de Ouro Branco, e os motivos que levou a sua substituição pelo Padre Salvador Leitão Matello, é desconhecida. O nome do Padre Carvalho foi excluído dos registros eclesiásticos e provavelmente foi denunciado pela própria igreja e sofreu perseguição religiosa. (mais informações no livro Ouro Branco dos Ciclos).
Segundo o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) “a Matriz de Santo Antônio já estava edificada no final do século XVIII. Em 1745, o altar de São Miguel e Almas teve seu douramento pelo mestre pintor Antônio de Caldas, supondo- se que o de Nossa Senhora do Rosário teria sido executado ao mesmo tempo. Essa informação ressalta ainda mais que nossa origem foi muito antes, pois sabemos que historicamente que as igrejas poderiam levar mais de 50 anos a serem construídas.

A igreja de Itatiaia segundo documento do IPHAN, possui data do começo do século XVIII, sendo das primeiras igrejas construídas na região. Do Livro Primeiro da Irmandade, atualmente na Cúria de Mariana, consta o primeiro assentamento de batismo em 20 de agosto de 1714.
A antiga Casa Paroquial com características comuns às construções do período colonial, a edificação datada de 1759, conforme inscrição em pedra sobre sua portada principal, mostra que no município já existia considerável situação econômica, visto que este tipo de construção exigia uma classe econômica estável.
A capela de São Vicente Ferrer está localizada na comunidade do Morro do Gabriel, pequeno povoado localizado na zona rural de Ouro Branco. A capela apresenta características marcantes da arquitetura colonial religiosa da 1ª fase do barroco mineiro, lembrando que o barroco no Brasil ocorreu entre 1601 e 1768.
Ao pesquisar documentos e livros de tombos existentes na Biblioteca eclesiástica de Mariana é possível confirmar que o arraial era um local considerado importante para a economia local. Felizmente esses registros aconteceram devido a igreja católica e ao diário das comunidades pelos padres. A Paróquia de Ouro Branco teve registros desde 1740 (abertos ao público), muitos dos relatos são relativos à vida religiosa local. Informações como sepultamentos no adro da Igreja, casamentos, batizados entre outros. Entre eles está o relato da construção da Capela dos Lazaristas, realizada em 02 de novembro de 1927, por ocasião das Santas Missões pregadas pelos padres Lazaristas (os mesmos religiosos que administravam o Colégio do Caraça). Esses padres chegaram a Ouro Branco com o objetivo de conscientizar a população sobre os riscos para a saúde da prática do sepultamento dentro dos templos religiosos.
No ano de 1918 foi designado em Ouro Branco um pequeno cemitério paralelo, localizado no Alto do Cruzeiro, lugar afastado do centro da cidade, para o sepultamento das vítimas da Gripe Espanhola, epidemia contaminou inúmeros moradores da região, nesta época o padre Carvalho realizou várias cerimônias fúnebres.
A nossa história é muito rica e principalmente os primórdios de nossa origem não pode ser apagado ou ignorado, Ouro Branco não tem 300 anos de história ou fundação, ele tem muito mais!
Muitas vezes me indignei com a inserção de erros que se tornam difíceis de apagar da memória da população, que considero muito sérios como a denominação e a propagação da história da “Fazenda Tiradentes”, que debato e relato através dos fatos com registros históricos confiáveis. Sabendo da dificuldade e do desinteresse de divulgar a história de Ouro Branco fico muito aborrecida com o nível de manipulação e desinformação.
Se você está lendo este artigo provavelmente poderá ter a consistência de reconhecer que o tempo da nossa história importa. Reconhecendo os 300 anos de fundação, estaremos enterrando mais de 30 anos de registros de vidas, apagando da nossa história Padre Carvalho, acontecimentos e informações que poderiam estar sendo ensinados nas escolas.
E o mais extraordinário, apagando completamente o importante fato da inquisição católica, que esteve em nosso meio histórico e que ceifou o pensamento e a busca da liberdade pessoal, importe-se e acredite por mais Padres Carvalhos.